Até 26 de Novembro, está patente exposição, Keeping things pretty straight da artista Jeanine Cohen. Não é preciso conhecer as fotografias onde Jeanine Cohen enquadrou janelas, gradeamentos, estores, vitrinas, redes, divisórias, tapumes, pré-fabricados, degraus, etc, para identificarmos estes elementos e os (re)encontrar nos planos, linhas, grelhas, tracejados, sombras, texturas, transparências, visibilidades, opacidades, etc, presentes na sua pesquisa visual. Se virmos as suas fotografias, já que é opção, e certeira, não as apresentar na galeria mas no seu site ou em livros de artista, reconhecemos arquitecturas do quotidiano assinaladas pelo olhar caminhante nas cidades por onde Jeanine passou como Telavive ou Lisboa, nas viagens nos EUA ou nos períodos de residência na Islândia. Raras são as vezes em que um edifício, fotografado na rua de alguma cidade por Jeanine Cohen, não é enquadrado de esquina, de esguelha, da perspectiva que incita ao movimento, e que em resultado desta acção, promove a visibilidade de múltiplos planos. Arrisco: este posicionamento do olhar não é uma estratégia para ganhar, no seu registar, a volumetria de um bloco de apartamentos. Começo por descrever a minha (aparente) contradição. O olhar procura descrever a anatomia de uma cidade ao final do dia (não se vêm pessoas nas ruas de Jeanine), o olhar procura guardar a precisão do precário, ou da ruína, de arquitecturas anónimas. E no entanto, creio que esta documentação colectada (de objectos, materiais, corpos que preenchem as nossas cidades) é o “motivo” para a produção de esculturas (ainda que estas sejam de colocação na parede), mas a artista assume-se como pintora. E, na realidade, ela lida essencialmente com o plano bidimensional da pintura: superfície, linha e cor. Uma contradição (sua) apenas aparente. Por partes. A superfície de trabalho: a tela nas pinturas-que-não-são-esculturas é a parede de uma casa, de uma galeria – e que melhor síntese, ou símbolo, da volumetria, do que uma casa? A linha de acção: os traços são consubstanciados em réguas de madeira polida e pintada apenas numa das faces, estas, muitas vezes, são amovíveis ao longo da esquadria que perfazem, lembrando janelas. As cores são duplamente reflectidas: quase nunca de apreensão directa. Se aqui, a superfície é a parede, a linha uma tira de madeira, a cor é o que não é palpável. De certa maneira são as cores que reenviam para a dimensão da pintura ou, por outras palavras, que nos relembram do encontro entre a experiência do real e estética, e.g. as variações cromáticas do céu reflectidas na ondulação de um telhado galvanizado. É esta leveza combinada com exactidão que convoca a ideia de arquitectura no trabalho de Jeanine Cohen. Nas peças que agora são apresentadas impera uma verticalidade. Podendo esta mudança de eixos ser entendida como um brecha na linha do horizonte. Concentrando tudo numa aresta, na tal esquina, que convida ao movimento e à descoberta da multiplicidade de planos. No desenho, o mesmo acontece – jogando com a noção de escala – o corte, a dobra e consequente produção de sombra sinalizam uma malha urbana, onde um viajante descobre pormenores de uma arquitectura involuntária que já é desenho. Escolho começar e acabar este breve texto com excertos d’ As Cidades Invisíveis de Italo Calvino, essas paisagens (que a cada leitura se renovam) descritas por Marco Polo a Kublai Kan. A veracidade da sua existência não é uma questão na ficção assim como, não é importante a que cidade cada trabalho de Jeanine Cohen corresponde. Porque o movimento que cada um faz em torno de cada desenho, pintura ou fotografia refaz a sua geografia, tornando visíveis, a cada olhar, novas cidades. Assim – há quem diga – confirma-se a hipótese de que cada homem traz na mente uma cidade feita só de diferenças, uma cidade sem figuras e sem forma, e são as cidades particulares que a preenchem. (Maria do Mar Fazenda, Agosto de 2011)
Legenda da imagem: Jeanine Cohen, Vertical Yellow II, 2010, Acrílico s/ madeira (Ayous), 190 x 27 x 9 cm
Caroline Pagès Gallery | Rua Tenente Ferreira Durão, 12 – 1o Dto. [Campo de Ourique] | Lisboa | Segunda a Sábado das 15h às 20h | www.carolinepages.com
Legenda da imagem: Jeanine Cohen, Vertical Yellow II, 2010, Acrílico s/ madeira (Ayous), 190 x 27 x 9 cm
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